FALA O TÓ (futuro fotógrafo), e o Narrador narra

— Pá, fui ver um filme. Porreiro. Por acaso porreiro. Como é que aquilo se chamava? Olha, não me lembro. O que eu queria mesmo era fazer cinema, ‘tás a ver? É outro mundo.
Começa a contar cenas do filme. Alguém o interrompe:
— Não vais contar o filme todo, pois não?
— Não, é só isto: há uma cena em que uma miúda está em casa, à janela, com uma carabina, e começa a disparar contra todos os putos com blusões de ganga que vêm da escola. Depois a polícia agarra-a e perguntam-lhe: miúda, porque é que fizeste isto? E ela responde: não gosto de blusões de ganga. ‘Tás a ver? Não gosto de blusões de ganga. Os americanos são malucos.
/.../
Vão três ou quatro, portanto, e passo de passeio junto ao rio: uma água escura como óleo queimado, a cidade maior a mexer-se do outro lado. Está serena a noite, apesar do frio. O guarda-nocturno, lá ao fundo, na guarita, dormita. O Tó já vai na terceira cena do filme. (Ele, primeiro, fala; depois, vai acrescentando). Alguém lhe diz: “falas de mais”. Sai à mãe. Todos saem aos seus. No fundo, ninguém degenera.
— Viste aquela com que eu cheguei ali? Não me larga. Quer que eu lhe faça umas fotografias. É o que estas tipas querem todas: ser vedetas. Fama e vida fácil.
Fumam o haxixe. As luzes da iluminação pública começam a tremelicar. O frio, parado, faz margens. Irmãos, sonhemos sonhos incontrolados. Venham a nós essas princesas espertas. Façam-se os filmes. Fama e vida fácil. Fama e vida fácil.

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